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Junho de 2021

 

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Palavras que marcam

     
Nuno Camarneiro,  "No meu peito não cabem pássaros"
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Abrindo-se à comunidade e evidenciando a importância da escola na criação de jovens informados e intervenientes, a sessão solene comemorativa dos quarenta anos do 25 de Abril da Assembleia Municipal de Bragança realizou-se no Agrupamento de Escolas Abade de Baçal e contou, para além das intervenções políticas habituais, com a de uma aluna do referido estabelecimento.

A sessão, aberta e conduzida pelo presidente da Assembleia Municipal, Luís Afonso, constituiu-se como oportunidade para revisitar alguns dos momentos que antecederam e concretizaram a revolução dos cravos e também a nossa história mais recente e para reforçar a importância das palavras e da intervenção cívica num país democrático.

As primeiras intervenções pertenceram aos representantes dos presidentes de freguesias e Agrupamentos de Freguesias, respectivamente, Filipe Fernandes, (PS), da União de Freguesias de Izeda e Luís Martins (PSD), presidente da Junta de Donai. A estes seguiram-se Bruno Veloso, do PS, Eduardo Malhão, do PSD, Henrique Ferreira, do Movimento Sempre Presente, António Morais, da CDU, Francisco Pinheiro, do CDS, Mariana Lopes, aluna do Agrupamento (intervenção reproduzida na caixa da página ao lado), Hernâni Dias, presidente da Câmara Municipal, e, finalmente, o presidente da Assembleia Municipal, que encerrou a sessão.

As diferentes intervenções traçaram um percurso histórico, salientando as mudanças que a Revolução dos Cravos trouxe ao país, mas também os diferentes obstáculos que foi necessário superar nas últimas quatro décadas, desde o recurso ao Fundo Monetário Internacional, à emigração, e os acontecimentos que determinaram um novo rumo para o país, como a entrada na Comunidade Económica Europeia. Elogiou-se, fortemente, o papel dos capitães que asseguraram que a revolução fosse tranquila e pacífica e, por isso, única.

Salientou-se, também, que a Assembleia é o lugar das palavras e que  esta tem de ser usada para “puxarmos pelo entusiasmo e dinamismo e contagiarmos os outros; não há data melhor do que esta para a reflexão sobre o modo como criar uma sociedade justa”, defendeu o representante centrista. Este acrescentou, ainda, que “pensar diferente não configura um delito, por isso é necessário respeitar aqueles que têm uma opinião diferente. Alertou depois o poder autárquico Brigantino para a necessidade de estar empenhado no desenvolvimento de uma sociedade mais justa e plural, porque “ a força da democracia vem do impulso de cada um. É preciso criar mecanismos para a existência de uma democracia mais ativa e empenhada.” Também o combate à corrupção, imprópria numa sociedade justa, foi abordado, com António Morais a lembrar a “prática honesta dos autarcas da CDU, entre os quais não se conhece nenhum caso de corrupção, ao contrário do que acontece nos restantes partidos”. Este deputado criticou, ainda, o sistemático não cumprimento de promessas programáticas e lançou um alerta para a necessidade de responsabilizar as opções políticas que contribuem para o definhamento do pais. 

Face à marca genética que o 25 de Abril deixou e que é indelével, Bruno Veloso criticou a subserviência do governo aos mercados, as recentes declarações de Durão Barroso, nas quais elogiou a educação do Estado Novo, os cortes  que a educação vai sofrer em 2015 e comparando os números de alunos antes e após o 25 de abril, concluiu que “sem educação nunca se cumprirá abril”. Acrescentou, ainda, que os anos de governação à direita têm sido recuos aos valores de abril, como a pobreza, a crise do estado social, a emigração e o pesadelo do abandono que regressou ao nordeste, com o encerramento de serviços. Com uma cidade moribunda e esquecida do poder central, a autarquia deve preocupar-se com a dignificação da vida humana, pois as pessoas são a verdadeira agenda dos políticos. 

A descrença na democracia e a forte crise podem explicar, segundo Henrique Ferreira, o pessimismo dos portugueses, evidenciado em estudos recentes, que analisaram a perceção dos portugueses sobre a democracia e que apresentam resultados preocupantes: 83% estão insatisfeitos com a democracia, num estudo, 75%, noutro, o que “quer dizer que podemos estar no limiar de algo perigoso.”, defendeu. Eduardo Malhão também abordou esta crise na democracia, mas citando Churchil referiu que “a democracia e a pior forma de governo, salvo as outras que tem sido experimentadas de tempo em tempos.” É por isso importante, segundo o militante social democrata,  celebrar Abril, fazer um apelo à memória colectiva, lembrar as suas conquistas e transmitir às gerações mais novas os valores da revolução, que ensinou ao mundo que era possível fazer uma revolução sem sangue. Esta devia, defendeu,  ser património imaterial da humanidade para ser elemento unificador e não arma de divisão e de arremesso. E “unidos, podemos combater o desemprego, a crise demográfica, o despovoamento do interior, o centralismo como adversário do poder local e do desenvolvimento do interior”. 

O combate às assimetrias regionais resultantes de políticas centralistas e a necessidade de implementar políticas que invertam a tendência de esvaziamento foram duas linhas de acção apontadas pelo Presidente do Município, que enalteceu Bragança comparando o seu índice de desenvolvimento com o do passado e o de outras capitais de distrito do interior. Em 1981 Bragança apresentava um índice de desenvolvimento negativo (-1,9), passando em 2011 para 6,4, registando o melhor índice no conjunto das capitais de Distrito analisadas pelo Professor Doutor Francisco Cepeda. Ao nível da formação da população do Concelho, em 2011, segundo os últimos censos, a percentagem dos residentes com licenciatura completa foi superior em 4% face à média do País, 5,6% acima da Região Norte, 6,5% acima da média do Alto Trás-os-Montes e 5,98% acima da média do Distrito de Bragança. Isto mostra, segundo Hernâni Dias,  que “durante os últimos anos foram construídos os alicerces para a construção de uma nova edificação imaterial, virada para o conhecimento, a inovação, a criação de riqueza e emprego, nomeadamente para os mais jovens, por forma a prosseguir os grandes objetivos de desenvolvimento”

Por isso, segundo o autarca, a crise não pode ser um pretexto para virar costas ao interior e desinvestir em regiões que sempre contribuíram para o crescimento do pais. Defendeu a  reivindicação do restabelecimento da ligação aérea e do IP2 para norte entre Bragança e Puebla de Sanábria e a expansão do Aeródromo Municipal de Bragança para Aeroporto Regional, apesar dos dados que mostram que Portugal possui uma boa rede rodoviária e não haver, por isso, financiamento para este tipo de obras, Segundo o autarca,  “o mais correto e justo seria uma análise à situação particular de cada região e não no seu todo.”, Considera, também, necessárias mais especialidades médicas e melhores condições nos estabelecimentos de saúde. Lembrou depois que o desenvolvimento sustentável na região se concretizaria através de três grandes linhas orientadoras: a coesão social, a regeneração urbana e o desenvolvimento económico e competitividade e terminou com um incentivo a todos os brigantinos para que se unam na luta pela região:” É nosso dever, enquanto cidadãos que herdámos um país livre, fruto do sonho dos Capitães de Abril, lutar diariamente pela liberdade, pela promoção da cidadania e da democracia e que isso se traduza numa melhor qualidade de vida dos nossos concidadãos.

No encerramento da sessão, o Presidente da Assembleia, Luís Afonso, 

lembrou o propósito desta sessão comemorativa inédita:  abrir a cerimónia a comunidade, nomeadamente à camada mais jovem, o que justifica a escolha de um estabelecimento de ensino. Agradeceu em particular à direcção da escola, na pessoa da sua diretora, Teresa Sá Pires, por ter respondido com prontidão ao desafio lançado pela Assembleia Municipal.

Depois, lembrando a crise que tantas dificuldades tem trazido às famílias, desejou que a reforma do estado se concretizasse e aliviasse o sofrimento das famílias e revelou a sua discordância relativamente a políticas que castigam mais uma vez os territórios regionais que, pelo contrário, são os que  mais precisam de incentivos ao desenvolvimento.

 

 

Intervenção da aluna Mariana Lopes na sessão comemorativa

Os jovens e o 25 de abril

Há exatamente 40 anos Portugal vivia um dos momentos mais importantes da sua história. Um momento que revolucionou a vida de todos nós e que permitiu que tivéssemos direito a muitos dos privilégios que temos hoje, como este de estarmos aqui e de livremente nos expressarmos. Mas não é claro que exista nos jovens a consciência da importância desse momento. Desde logo porque para nós quarenta anos é uma eternidade.

Talvez por isso há ainda muitos que ignoram completamente o significado de um dia como o que comemoramos hoje, bem como a diferença entre a vivência numa ditadura ou numa democracia. Há outros jovens que, pelo contrário, são pessoas informadas e preocupadas com a sociedade em que vivem e que sabem que depende também de si aquela que vão construir, mas alguns destes atuam com alguma indiferença relativamente à data que comemoramos hoje. Isto significa que a cultura democrática não está enraizada e que a família, a escola e a sociedade estão a falhar.  

Na verdade, na escola, este tema não é muito abordado, uma vez que só é leccionado durante o nono ano de escolaridade, na disciplina de história, e abordado pontualmente no 12º ano, na disciplina de português. O tempo que lhe é dedicado não me parece, portanto, suficiente. Penso que falo por muitos jovens quando afirmo que a revolução de Abril, tudo o que a antecedeu e o modo como foi bem sucedida, é um assunto muito estimulante e que termos mais conhecimento e informação sobre o 25 de Abril seria determinante no modo como nos posicionamos na sociedade. O que nós temos hoje é fruto do esforço de pessoas que foram corajosas e determinadas e que, mesmo sabendo que podiam ter perdido tudo (inclusive a vida), decidiram não desistir, e isso é um ensinamento muito importante.

É, portanto, importante que todos nós, jovens, saibamos bem o que custou a democracia. Mas é também importante que a saibamos viver plenamente. E isso implica uma participação cívica ativa: os jovens têm de estar informados sobre a situação política, social e económica do país, têm de debater assuntos e trocar opiniões, devem participar em iniciativas que estimulem o desenvolvimento do país e lutar pelos interesses, não pessoais, mas dos grupos nos quais estão integrados. 

No entanto, esta participação cívica e política não acontece tão frequentemente quanto desejado. Repare-se, por exemplo, no caso do projeto Parlamento dos Jovens, que tenta promover o debate e sensibilizar os jovens para a importância da vida parlamentar, e para o qual, pelo menos na escola que frequento, não é fácil encontrar grupos de jovens participantes. Talvez isto seja o resultado de  nunca termos vivido numa época em que o regime político nos oprimia e impedia de ser o tipo de pessoas que desejaríamos. 

Pelo contrário. Vivemos num tempo em que há vários partidos políticos e em que temos oportunidade de escolher qual aquele que representa melhor os nossos ideais. Podemos, ainda, expressar a nossa opinião, podemos discutir as diferentes perspetivas, podemos escrever o que quisermos e temos a oportunidade de divulgar as nossas ideias livremente, desde que o façamos de forma responsável. E esta aliança entre liberdade e responsabilidade é um legado de Abril. Os meios de comunicação podem difundir a informação sem esta ter de ser analisada previamente por nenhuma comissão de censura. Não há censura. Há incentivos à educação e à formação superior. E temos tantos outros privilégios dos quais não nos apercebemos. 

Em suma, apesar da facilidade com que hoje temos tudo ao nosso alcance, não podemos esquecer que o 25 de Abril representa a esperança de um futuro melhor para todos, a possibilidade de todos vencerem os mesmos obstáculos, a igualdade de oportunidades para todos, o direito à liberdade de opinião e expressão, a possibilidade de participar civicamente na construção da sociedade em que vivemos. Ainda que isto pareça utópico e mesmo quando a esperança parece vã e a vontade se desvanece, estas foram portas que a Revolução de Abril abriu, porque esta representa também a força dos homens que vão à luta porque acreditam nos seus ideais. Hoje comemoramos a liberdade e temos de aprender o seu valor para poder assegurar que as portas que Abril abriu não voltam a fechar-se, como dizia Ary dos Santos. Por isso, mais do que insistir em tudo o que foi feito e criticar o que ficou por fazer, penso que seria melhor aproveitar a comemoração deste dia para debater o futuro do país, pensar em formas de desenvolvimento, criar estruturas que permitam que os jovens se fixem cá, abrir portas para que os jovens sintam que os valores que Abril conquistou continuam válidos e são fundamentais e que há um país que quer que eles fiquem e participem. Há um país que quer que eles sejam jovens de Abril que sabem o valor da democracia, da liberdade e da responsabilidade. 

 

 

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