Palavras que marcam

     
Nuno Camarneiro,  "No meu peito não cabem pássaros"
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A obra "Os Maias" foi publicada em 1888, ano em que, curiosamente, nasceu Fernando Pessoa. Trata-se de um romance, uma vez que constitui uma narrativa de grande extensão com um número muito elevado de personagens, apresentando uma ação muito extensa que decorre em vários espaços e ao longo de várias décadas.

Assim sendo, esta obra queirosiana apresenta várias características do realismo, tais como o relevo dado ao presente, o cosmopolitismo, o anticlericalismo, as personagens tipo e as descrições pormenorizadas, socorrendo-se de uma linguagem objetiva. Além disso, a ironia constitui um elemento estético que está sempre presente, servindo os propósitos da crítica a que Eça de Queirós constantemente recorre.
Desta forma, este grande romancista descreve a realidade fazendo referência a características ou atitudes que pretende caricaturar. Denote-se o exemplo da personagem Eusebiozinho, que, n'"Os Maias", é constantemente alvo de críticas, através das referências a um modelo educacional totalmente oposto ao de Carlos da Maia, que o narrador denuncia como um dos fatores fundamentais para o enfraquecimento do corpo e do espírito.
Assim, Eça de Queirós socorre-se frequentemente do diminutivo com a intenção de ridicularizar a personagem, mostrando as suas fragilidades e as limitações impostas pela educação que lhe era ministrada: "A mamã prometeu-lhe que, se dissesse os versinhos, dormia essa noite com ela... Isto decidiu-o [...] Disse-a toda - sem se mexer, com as mãozinhas pendentes...”.
Consequentemente, também o episódio da crónica de costumes relativo às corridas de cavalos no Hipódromo de Belém constitui um importante marco na ação da história, dado que o autor critica fortemente a elite lisboeta – "um sopro grosseiro de desordem reles passava sobre o hipódromo, desmanchando a linha postiça de civilização e a atitude forçada de decoro" –, o que demonstra o interesse fictício relativamente à atividade desportiva que decorria. Assim, Eça pretende pôr em evidência o desejo de parecer sofisticado daqueles que importavam hábitos culturais estrangeiros, revelando o provincianismo das elites. Ainda no mesmo episódio, momentos antes do início das corridas de cavalos, ocorrerá uma situação constrangedora resultante do espaço em que as mesmas decorriam, evidenciando que o local em causa era profundamente desadequado: "À entrada para o hipódromo, abertura escalavrada num muro de quintarola, o faetonte teve de parar atrás do dog-cart do homem gordo - que não podia também avançar porque a porta estava tomada pela caleche de praça, onde um dos sujeitos de flor ao peito berrava furiosamente com um polícia”.
Em suma, a ironia está presente na obra queirosiana, de forma bastante evidente, satirizando-se costumes da época, o que torna este romance muito apelativo, dado que retrata de forma realista a sociedade do século XIX.

 

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