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No dia 28 de fevereiro do corrente ano, no âmbito da atividade Masterclasses em Física de Partículas, organizada pelo Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas (LIP), que decorreu na Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Bragança do IPB, tivemos a oportunidade de entrevistar o professor Pedro Abreu, distinguido, recentemente, com o Prémio Ciência Viva - Educação, pelo seu empenho no ensino e divulgação da Física em Portugal, tanto junto de estudantes, como de professores do ensino secundário.

Pedro Abreu é professor associado no Instituto Superior Técnico, onde leciona as disciplinas de Mecânica, Eletromagnetismo e Ótica. Foi mentor, responsável pela implementação e principal dinamizador do projeto Masterclasses de Física pelas escolas do país, juntando cientistas com aspirantes a universitários, tendo contribuído para o sucesso nacional da procura de cursos de Engenharia Física. Tem-se também empenhado nos cursos de formação de professores que decorrem no CERN, que têm sido muito importantes para a capacitação dos docentes nas práticas e técnicas mais recentes da física de partículas.
Durante anos foi responsável pelas Olimpíadas da Física a nível nacional e das Olimpíadas Internacionais da Física, que decorreram em Lisboa, em 2018, que juntaram centenas de estudantes do ensino secundário, a nível internacional.
Foi um dos participantes da iniciativa Explica-me como se tivesse 5 anos, onde falou sobre “O Universo tem fim?”, apresentação disponível em: https://tunein.com/podcasts/2394016/?topicId=206444484

Em primeiro lugar, agradecemos a sua disponibilidade para nos conceder esta entrevista.
Pedro Abreu: Faço-o com todo o gosto.

Como nasceu a sua paixão pela física?
Aos 13 anos, li um livro sobre a transformação do chumbo em ouro, sobre as transformações nucleares e de como era feita a estrutura do universo, que se investigava no CERN, e, portanto, decidi que a minha vida seria física experimental de partículas e que iria estudar no CERN. Grande sorte!

A sua formação inicial e a sua investigação basearam-se na física fundamental. São necessárias algumas características especiais para alunos, como nós, podermos enveredar por esta área?
Sim, nomeadamente uma paixão enorme e espírito de curiosidade, tendo em conta que, cada um de nós, não se satisfaz com respostas vagas nem curtas e está sempre à procura de saber mais. Depois, o resto vem por acréscimo.

Recentemente, foi distinguido com o Prémio Ciência Viva - Educação. O que o motiva a dedicar muito do seu tempo à divulgação da física em detrimento da investigação?
Vocês.

Na sua palestra, de hoje, falou-nos da Tabela Periódica de Mendeleiev e, seguidamente, de uma tabela com 12 partículas, que é mais atual, e que explica a Tabela Periódica. Porque é que não se ensina na escola o Modelo Padrão das Partículas? Tem alguma ideia?
No início do sétimo ano, ensina-se o universo e a estrutura da matéria até ao átomo. Depois, o problema é que para ensinar coisas mais profundas é preciso um bocadinho mais de conhecimento.
Na escola, temos de trabalhar para levar o Modelo Padrão das Partículas (ou seja, do que é que nós somos feitos) à mais pequena escala possível. Para isso, temos de preparar os professores, para poderem lecionar esses conteúdos, pois estes não são assim tão fáceis quanto às vezes nós queremos transmitir, numa palestra de divulgação. Os conteúdos podem ser mais complexos e os alunos podem colocar perguntas bastante pertinentes e difíceis de responder. Então, para preparar os professores é que nós temos uma escola com esse objetivo, no CERN, em língua portuguesa, que está a prepará-los com conteúdos de física moderna, que não eram dados nas faculdades, quando eles tiraram o curso. Eu, quando tirei o curso, tive física moderna porque fui para o ramo científico. Se fosse para o ramo do ensino, não teria tido física moderna.
Assim sendo, há vários professores, alguns da vossa escola, que já participaram neste programa de formação docente, em física moderna, para professores de escolas portuguesas. É neste programa que nós procuramos levar cada vez mais professores a envolverem-se neste tema do Modelo Padrão das Partículas, para que possamos, um dia, inserir os conteúdos de física moderna, em particular de física de partículas, no currículo escolar. É essa a nossa ambição.

Que saídas profissionais existem para as pessoas que tirem licenciatura e mestrado na área de física?
Basicamente, até há 20 anos, eu diria que as perspetivas eram a investigação e a docência, em todos os níveis de ensino, ou numa empresa que quisesse trabalhar com física. Por exemplo, as empresas com calibração de equipamentos, que têm de calibrar forças, massas, volumes, tempos, etc., têm de o fazer com precisão, e, como tal, recorrem à contratação de físicos. Nos últimos 20 anos, tem havido uma enorme revolução, porque temos notado que os nossos melhores alunos, depois de passarem anos a investigar, acabam por abandonar a investigação. Enquanto uns continuam neste ramo, porque os apaixona, outros enveredam por outras carreiras que, até a nós, nos espanta.
Por exemplo, um dos diretores executivos da Renova é um físico formado no Instituto Superior Técnico, outro é o diretor de logística, na fundação Bill & Melinda Gates. Pode imaginar o que é que faz um físico a tratar de logística numa coisa com a dimensão da Bill & Melinda Gates Foundation?
Estes são exemplos para dizer o que o faz o físico, até chegar a estas posições. O físico aprende a resolver problemas e muita matemática. E como aprende muita matemática e a resolver problemas do dia a dia, com essa matemática e com outros modelos, ou porque inventa modelos matemáticos, quando não os tem disponíveis, torna-se mais capaz de interpretar e decidir.
Newton fez isso, inventou o cálculo diferencial, que não existia no seu tempo, na mesma altura que outro grande matemático da época, Leibniz, que também o inventou, em paralelo, para resolver problemas do seu quotidiano. Isto é para dizer que os físicos quando não têm, inventam, desenvolvem, investigam, procuram soluções. E as empresas apreciam isso, enormemente. Foi o que nós aprendemos, nos últimos 20 anos. Temos vindo a perder físicos de topo porque as empresas lhes pagam 10 vezes mais, ou 20 vezes mais.
Imaginem o físico a investigar o Bosão de Higgs, ..., mas há ali uma pessoa a dizer que lhe paga o triplo, ..., bom se calhar, se calhar tem família, e pronto, lá se vai o físico!

Atualmente é possível desenvolver ciência individualmente como, por exemplo, o fez Einstein?
Num certo sentido, sim. Não só fez Einstein como fizeram muitos outros. A física teórica é um trabalho individual, embora, neste momento, já seja de grupo também, mas de pequenos grupos, duas ou três pessoas.
Na física experimental, já não é possível desenvolvê-la, individualmente. Os últimos físicos experimentais individuais são dos anos 50 e 60, do século passado, altura em que as equipas experimentais não tinham mais de cinco pessoas. Hoje, as equipas experimentais precisam de, por causa daquilo que temos de investigar, porque já foram dadas as respostas aos problemas que precisavam de 5 pessoas para as descobrir. Não vamos investigar a mesma coisa. Para isso já temos a solução, não é? Para isso vamos as bibliotecas.
Hoje, para investigar problemas de fundo, em certas áreas de fronteira, temos de ter equipamentos tão caros, que uma pessoa sozinha não tem dinheiro, nem arranja dinheiro, nem financiamento para participar, nem depois, a pessoa sozinha pode montar tudo. Os equipamentos, como aqueles de que falámos esta manhã, levam dezenas de anos a montar, por milhares de pessoas. Portanto, envolvem muita gente, são equipas muito grandes.

Para concluir, se tivesse de convencer um aluno para ir para esta área, o que lhe diria?
Diria, de outra maneira, vai para ciência, se não fores capaz de fazer mais nada, que é como quem diz: Cientista é aquele cuja paixão pela ciência é tão grande que não se é feliz a fazer mais coisa nenhuma. Não tem de ser um cientista em física, pode ser em química, em biologia, em medicina, sei lá, um cientista em muitas áreas. Agora, se, por outro lado, a pessoa não tem a certeza se quer ser engenheiro civil, ou se quer ser engenheiro mecânico ou eletrotécnico, sei lá, ou se quer ser poeta ou escritor, ou uma coisa qualquer, se tem uma vocação para as ciências e não tem ainda a certeza qual, então é melhor tirar um curso de base. E os cursos de base são os de física e matemática que, depois, servem para o resto. Há muitos físicos que, posteriormente, vão trabalhar nas áreas da química, as áreas de fronteira de aplicações da física e química, da física e medicina, ou seja, vão trabalhar em áreas completamente diferentes. O que eu nunca vi foi um químico que se tornasse físico. Nem nunca vi um médico que se tornasse físico. Nem nunca vi pessoas, de outras áreas, tornarem-se físicos. Isso nunca aconteceu. Porque esta formação de física na licenciatura e no mestrado dá-vos uma intuição, ajuda a crescer a intuição, a educar a intuição, que é fundamental para abordar os problemas de física, com uns olhos práticos, pragmáticos, de chegar às soluções.

 

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