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Atualmente, todos nós ouvimos falar de crise, contudo convém entender o seu verdadeiro significado. A crise é um conceito utilizado em vários ramos do saber, nomeadamente, na sociologia, na política, na economia, na medicina, entre outros. Mas a crise de que vamos falar pode ser definida, genericamente, como uma fase de perdas a vários níveis, verificando-se um profundo desequilíbrio económico, social e político.


A título de exemplo e de comparação das alterações que se verificaram na sociedade iremos, sucintamente, caracterizar as duas grandes crises do século XX, nomeadamente as crises de 1929 e a crise de 1983. A compreensão sociológica destas crises vai permitir-nos identificar as principais alterações e dificuldades que se estão a verificar na sociedade portuguesa com a atual crise que estamos a viver.

A grande crise ou depressão de 1929

A crise de 1929, também conhecida como grade depressão económica, teve início em 1929 e persistiu ao longo da década de 1930. Esta crise é considerada um dos piores momentos da História, como também uma das maiores ressecções económicas do século XX
As principais consequências desta crise foram as elevadas taxas de desemprego, as quedas drásticas na produção industrial, a desvalorização da moeda e as quebras vertiginosas da bolsa de valores. As ações na bolsa de valores de Nova Iorque foram as mais afetadas, dando origem à chamada Quinta-feira negra em que o valor das ações caiu a níveis nunca vistos e milhares de acionistas perderam num só dia avultadas somas de dinheiro e outros perderam todos os seus investimentos.
Esta grande depressão fez sentir os seus efeitos um pouco por todo o Mundo. Em Portugal não se se manifestou com tanta intensidade, embora se tenha notado uma acentuada quebra nas exportações e a redução da atividade económica o que originou um aumento significativo do desemprego.
Por outro lado diminuíram o envio das remessas dos emigrantes fragilizando ainda mais a economia e levando à desvalorização da moeda.
Os efeitos desta crise, no âmbito político, deram origem ao aparecimento de fortes partidos de extrema-direita, como por exemplo o nazismo na Alemanha, comandado por Hitler e em Portugal à ditadura protagonizada por Oliveira Salazar e mais tarde por Marcelo Caetano e que durou até ao 25 de Abril de 1974

Crise de 1983 – O Fundo Monetário Internacional (FMI) entra no país

A crise de 1983 teve muitos pontos comuns com a crise de 1929. De salientar as elevadas taxas de desemprego e as quedas dramáticas na produção agrícola, a elevada dívida externa, a queda da economia e muitas falências
Viveu-se então em Portugal um período de grande contestação social e frequentes manifestações.
“O programa aplicado foi muito exigente. Portugal recebeu 650 milhões de dólares do FMI - 3,5% do produto interno bruto da altura - e em troca aplicou cortes nos salários e no subsídio de Natal da função pública, aumentou os impostos e congelou as contratações e o investimento público. Além disso, avançou ainda com a desvalorização do escudo 13%, de forma a ganhar competitividade, tornando as exportações mais baratas e apetecíveis”
Portugal nessa época ainda tinha o escudo, ou seja uma moeda própria e a sua desvalorização veio a ajudar a ultrapassar a crise e a promover as exportações.

A crise que sentimos todos os dias na atualidade

Portugal vive hoje uma situação de crise económica, social e política que se agrava de dia para dia. Há quem considere a atual crise em Portugal, como a mais grave que se viveu nos últimos 150 anos.
De referir que esta crise está a fazer sentir os seus efeitos não só em Portugal mas em muitos países, principalmente da Comunidade europeia.
Assim, em 2011, o país, confrontado com uma elevadíssima dívida externa e com uma profunda crise económica e financeira viu-se obrigado a pedir ajuda. Num comunicado do Governo, os portuguese foram informados: "O Governo decidiu dirigir à Comissão Europeia um pedido de financiamento", a terceira vez no espaço de 30 anos
Esta crise é caracterizada, sobretudo, pela estagnação da economia e o aumento do desemprego que em Portugal atinge quase um milhão de portugueses. A dificuldade dos Bancos também estão a originar com que as PME não possam recorrer ao crédito e assim aumentar a produção e criar mais emprego.
A austeridade, em parte imposta pela Troika, faz com que o se fragilize o Estado social e diminuam os apoios aos cidadãos, nomeadamente no âmbito da saúde, da educação e da segurança social.
O corte nos vencimentos retrai o consumo e assim a economia também não cresce.
Naturalmente as consequências da crise também se fazem sentir no Distrito de Bragança, principalmente nas cidades e vilas onde a principal atividade económica assenta no sector do Estado, nomeadamente nos funcionários públicos.
Com a redução dos vencimentos da Função pública todo o comércio se esta a ressentir, pois as pessoas são obrigadas a reduzir drasticamente ao consumo.
Já é notório o número de falências que se verificam em todo o distrito, nomeadamente na cidade de Bragança, afetando principalmente o pequeno comércio tradicional. Um dos sectores mais penalizado pela crise é o sector da construção civil, pois as habitações não se vendem pela recusa dos empréstimos bancários para a compra de habitação e também pela redução dos rendimentos das famílias.
Por outro lado, o decréscimo do número de alunos em todos os estabelecimentos de ensino contribui para fragilizar ainda mais a precária economia do distrito de Bragança
No meio rural o impacto da crise não se sente tanto em virtude de ainda se praticar uma agricultura e uma pecuária, muitas vezes de sobrevivência que minimizam as dificuldades.
Por isso, o objetivo central da economia portuguesa tem de ser o reforço da competitividade das empresas que permita aumentar, de forma sustentada, as exportações.
Sem dúvida, como nas crises anteriores, Portugal irá superar esta crise, só não sabemos quando, nem quando haverá um sinal de esperança para os milhares de desempregados que não vislumbram o mais ténue sinal de luz ao fundo do túnel.
Para documentar o impacto da crise no comércio tradicional em Bragança, entrevistamos um empresário do ramo livreiro e material escolar, tendo em conta a diminuição da população escolar e da importância que as escolas tinham na economia local, bem como a diminuição dos rendimentos das famílias

Uma certa pobreza envergonhada

Principalmente nas vilas e cidades já se notam grandes dificuldades, nomeadamente no acesso aos bens de primeira necessidade.
O fenómeno da fome já está presente em muitas famílias, sobretudo quando os dois membros do casal estão desempregados.
Por outro lado, aumenta uma certa pobreza envergonhada que cada vez mais recorre a Instituições sociais que fornecem gratuitamente alimentos, ou refeições confecionadas e outros serviços.

Esta foi uma breve abordagem à crise profunda que atinge principalmente a comunidade europeia e que se faz sentir no quotidiano de todos nós que vivemos numa sociedade, numa cidade, numa família que se debate com enormes dificuldades e muitas incertezas.

Efeito da crise em direto

Outra Presença: Tem sentido a crise no volume de vendas na papelaria?
Livraria: Nós não somos excepção, como é óbvio, nota-se em todos os sectores, na livraria também porque as pessoas precisam mais de alimentos do que de livros. Embora se precise de ambos, as pessoas dão preferência à alimentação em detrimento dos livros.

O.P.: E tem sentido um decréscimo de clientes?
Livraria: Como é óbvio sim, a concorrência via internet é acentuada e há outros mercados e nota-se também em termos de clientes. Além disso o poder económico diminuiu, por isso diminuíram as compras.

O.P.: Em termos de vendas, diminuiu muito?
Livraria: E o reflexo da crise, nota-se, claro.

O.P.: vendem-se menos livros?
Livraria: Os livros escolares, por norma, as pessoas são obrigadas a comprar, nos livros escolares não se nota a crise. Nos livros não obrigatórios nota-se, só as pessoas com poder económico é que compram, as outras pouco, ou nada.

Ourivesaria: A venda de ouro também diminuiu. Tem a ver com a moda, mas também com a menor disponibilidade financeira dos consumidores e, ainda, porque, face à crise, o perigo de assaltos aumentou. As pessoas preferem, por isso, materiais menos cobiçados.
Mas o negócio do ouro deve dar lucro porque tem aberto diversos espaços de compra deste metal.
A verdade é que as pessoas moderam-se e compram prendas de valor mais baixo.

Por esta pequena amostragem da atividade do comércio tradicional é notório o impacto negativo da crise.
Também, utilizando uma abordagem empírica que resulta duma visita ao comércio tradicional da cidade de Bragança, constata-se um baixo número de clientes, muitas lojas já encerraram e a construção civil está sem atividade, em contraste com anos anteriores que era um sector em forte expansão.
Tudo isto origina um elevado desemprego, obrigando, principalmente os jovens, a optarem pela emigração o que origina a “exportação” da nossa mão-de-obra mais qualificada e mais produtiva.

 

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